«Seguro: Um zero à esquerda
Muitos constitucionalistas
têm levantado imensas dúvidas sobre a constitucionalidade do Orçamento de
Estado. Essa constitucionalidade apenas pode ser verificada pelo Tribunal
Constitucional. E esse só se prenunciará a pedido do Presidente da República ou
de um determinado número de deputados. São estas as regras em Portugal.
Deputados do PCP e do
Bloco de Esquerda irão, ao que tudo indica, cumprir a sua obrigação: se
têm dúvidas sobre a constitucionalidade de uma lei devem pedir ao tribunal
competente que faça a respectiva fiscalização. É possível que um grupo de
deputados do PS os venha a acompanhar, garantindo assim o número
necessário de deputados para pedir a fiscalização sucessiva da lei do
Orçamento. Mas António José Seguro já disse que não o fará.
Que toda a gente sabe que se opõe a este orçamento e que o seu combate
continuará a ser feito no "terreno político".
O papel da oposição não é
apenas deixar registado nos jornais e na televisão que se opõe a uma
determinada medida. Não é apenas ocupar uns lugares no Parlamento e justificar
a sua inutilidade com uma postura de "responsabilidade" vazia de
conteúdo. É ser consequente com a sua posição e cumprir as suas obrigações. No
princípio do mês, Seguro disse que queria um Orçamento "sem dúvidas
de constitucionalidade". Ou é um dos poucos portugueses sem essas dúvidas
ou a palavra "querer" não é suficiente para que faça qualquer coisa
por isso.
Se existe a convicção que
uma determinada lei, e ainda mais a lei do Orçamento, viola a lei
fundamental, é obrigação dos deputados pedir a verificação dessa
constitucionalidade. Assim garantem que não vivemos numa república das bananas
onde a lei constitucional é um mero adereço e a oposição uma mera sala de
espera para o governo seguinte. Quem não cumpre as suas funções na
oposição dificilmente as cumprirá no governo. Quem não zela pelo respeito pela
Constituição da República como deputado dificilmente o fará enquanto primeiro-ministro.
Quem fica quieto a ver um País a afundar não merece governá-lo.
Pedir a fiscalização da
constitucionalidade de uma lei é um privilégio dos deputados, do Presidente e
de mais uns poucos detentores de cargos públicos. É um ato essencialmente
político. E exigir o respeito pela lei fundamental também o é. Se o líder do
maior partido da oposição acha que a política se esgota no uso da palavra então
escolheu a atividade errada. É apenas um saco de vento.
Percebo bem qual é a
estratégia de Seguro. Não fazer ondas, não correr riscos, fingir-se de
morto para não poder ser responsabilizado por nada e esperar que a situação
apodreça de tal forma que o poder lhe caia no colo. Para fazer o quê com ele?
Nem o próprio sabe. Tenho-me queixado da aparente indisponibilidade do PCP e do
Bloco de Esquerda para participar numa solução alternativa a este desastre. Mas
com Seguro a coisa é mais grave: ele está indisponível para fazer oposição. O
problema do atual líder do PS não é a sua evidente falta de carisma. É o seu
desempenho corresponder ao seu conteúdo. Poucas vezes a política nacional
produziu tão pomposa inutilidade.»
por Daniel Oliveira, aqui
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