Partilho aqui mais uma das
muitas cartas abertas de cidadãos indignados do meu país para que esta sirva de
alento nestes tempos difíceis e nos dê a motivação necessária para continuar a
lutar.
"Exmo. Senhor Primeiro-Ministro,
Os signatários estão muito preocupados com as
consequências da política seguida pelo Governo.
À data das últimas eleições legislativas já estava em vigor o Memorando
de Entendimento com a Troika, de que foram também outorgantes os líderes dos
dois Partidos que hoje fazem parte da Coligação governamental.
O País foi então inventariado à exaustão. Nenhum candidato à liderança do
Governo podia invocar desconhecimento sobre a situação existente. O Programa
eleitoral sufragado pelos Portugueses e o Programa de Governo aprovado na
Assembleia da República foram em muito excedidos com a política que se passou a
aplicar. As consequências das medidas não anunciadas têm um impacto gravíssimo
sobre os Portugueses e há uma contradição, nunca antes vista, entre o que foi
prometido e o que está a ser levado à prática.
Os eleitores foram intencionalmente defraudados. Nenhuma
circunstância conjuntural pode justificar o embuste.
Daí também a rejeição que de norte a sul do País existe contra o Governo. O
caso não é para menos. Este clamor é fundamentado no interesse nacional e na
necessidade imperiosa de se recriar a esperança no futuro. O Governo não hesita
porém em afirmar, contra ventos e marés, que prosseguirá esta política - custe
o que custar - e até recusa qualquer ideia da renegociação do Memorando.
Ao embuste, sustentado no cumprimento cego da austeridade que empobrece o
País e é levado a efeito a qualquer preço, soma-se o desmantelamento de funções
essenciais do Estado e a alienação imponderada de empresas estratégicas, os
cortes impiedosos nas pensões e nas reformas dos que descontaram para a
Segurança Social uma vida inteira, confiando no Estado, as reduções dos
salários que não poupam sequer os mais baixos, o incentivo à emigração, o
crescimento do desemprego com níveis incomportáveis e a postura de seguidismo e
capitulação à lógica neoliberal dos mercados.
Perdeu-se toda e qualquer esperança.
No meio deste vendaval, as previsões que o Governo tem apresentado quanto
ao PIB, ao emprego, ao consumo, ao investimento, ao défice, à dívida pública e
ao mais que se sabe, têm sido, porque erróneas, reiteradamente revistas em
baixa.
O Governo, num fanatismo cego que recusa a evidência, está a fazer caminhar
o País para o abismo.
A recente aprovação de um Orçamento de Estado iníquo, injusto, socialmente
condenável, que não será cumprido e que aprofundará em 2013 a recessão, é de
uma enorme gravidade, para além de conter disposições de duvidosa
constitucionalidade. O agravamento incomportável da situação social, económica,
financeira e política, será uma realidade se não se puser termo à política
seguida.
Perante estes factos, os signatários interpretam - e justamente - o
crescente clamor que contra o Governo se ergue, como uma exigência, para que o
Senhor Primeiro-Ministro altere, urgentemente, as opções políticas que vem
seguindo, sob pena de, pelo interesse nacional, ser seu dever retirar as
consequências políticas que se impõem, apresentando a demissão ao Senhor
Presidente da República, poupando assim o País e os Portugueses ainda a mais
graves e imprevisíveis consequências.
É indispensável mudar de política para que os Portugueses retomem confiança
e esperança no futuro.
PS: da presente os signatários darão conhecimento ao Senhor Presidente da
República.
Lisboa, 29 de Novembro de 2012
MÁRIO SOARES; ADELINO MALTEZ (Professor Universitário-Lisboa); ALFREDO
BRUTO DA COSTA (Sociólogo); ALICE VIEIRA (Escritora); ÁLVARO SIZA VIEIRA
(Arquiteto); AMÉRICO FIGUEIREDO (Médico); ANA PAULA ARNAUT (Professora
Universitária-Coimbra); ANA SOUSA DIAS (Jornalista); ANDRÉ LETRIA (Ilustrador);
ANTERO RIBEIRO DA SILVA (Militar Reformado); ANTÓNIO ARNAUT (Advogado); ANTÓNIO
BAPTISTA BASTOS (Jornalista e Escritor); ANTÓNIO DIAS DA CUNHA (Empresário);
ANTÓNIO PIRES VELOSO (Militar Reformado); ANTÓNIO REIS (Professor
Universitário-Lisboa); ARTUR PITA ALVES (Militar reformado); BOAVENTURA SOUSA
SANTOS (Professor Universitário-Coimbra); CARLOS ANDRÉ (Professor
Universitário-Coimbra); CARLOS SÁ FURTADO (Professor Universitário-Coimbra);
CARLOS TRINDADE (Sindicalista); CESÁRIO BORGA (Jornalista); CIPRIANO JUSTO
(Médico); CLARA FERREIRA ALVES (Jornalista e Escritora); CONSTANTINO ALVES
(Sacerdote); CORÁLIA VICENTE (Professora Universitária-Porto); DANIEL OLIVEIRA
(Jornalista); DUARTE CORDEIRO (Deputado); EDUARDO FERRO RODRIGUES (Deputado);
EDUARDO LOURENÇO (Professor Universitário); EUGÉNIO FERREIRA ALVES
(Jornalista); FERNANDO GOMES (Sindicalista); FERNANDO ROSAS (Professor
Universitário-Lisboa); FERNANDO TORDO (Músico); FRANCISCO SIMÕES (Escultor);
FREI BENTO DOMINGUES (Teólogo); HELENA PINTO (Deputada); HENRIQUE BOTELHO
(Médico); INES DE MEDEIROS (Deputada); INÊS PEDROSA (Escritora); JAIME RAMOS
(Médico); JOANA AMARAL DIAS (Professora Universitária-Lisboa); JOÃO CUTILEIRO
(Escultor); JOÃO FERREIRA DO AMARAL (Professor Universitário-Lisboa); JOÃO
GALAMBA (Deputado); JOÃO TORRES (Secretário-Geral da Juventude Socialista);
JOSÉ BARATA-MOURA (Professor Universitário-Lisboa); JOSÉ DE FARIA COSTA
(Professor Universitário-Coimbra); JOSÉ JORGE LETRIA (Escritor); JOSÉ LEMOS
FERREIRA (Militar Reformado); JOSÉ MEDEIROS FERREIRA (Professor
Universitário-Lisboa); JÚLIO POMAR (Pintor); LÍDIA JORGE (Escritora); LUÍS REIS
TORGAL (Professor Universitário-Coimbra); MANUEL CARVALHO DA SILVA (Professor
Universitário-Lisboa); MANUEL DA SILVA (Sindicalista); MANUEL MARIA CARRILHO
(Professor Universitário); MANUEL MONGE (Militar Reformado); MANUELA MORGADO
(Economista); MARGARIDA LAGARTO (Pintora); MARIA BELO (Psicanalista); MARIA DE
MEDEIROS (Realizadora de Cinema e Atriz); MARIA TERESA HORTA (Escritora); MÁRIO
JORGE NEVES (Médico); MIGUEL OLIVEIRA DA SILVA (Professor
Universitário-Lisboa); NUNO ARTUR SILVA (Autor e Produtor); ÓSCAR ANTUNES
(Sindicalista); PAULO MORAIS (Professor Universitário-Porto); PEDRO ABRUNHOSA (Músico);
PEDRO BACELAR VASCONCELOS (Professor Universitário-Braga); PEDRO DELGADO ALVES
(Deputado); PEDRO NUNO SANTOS (Deputado); PILAR DEL RIO SARAMAGO (Jornalista);
SÉRGIO MONTE (Sindicalista); TERESA PIZARRO BELEZA (Professora
Universitária-Lisboa); TERESA VILLAVERDE (Realizadora de Cinema); VALTER HUGO
MÃE (Escritor); VITOR HUGO SEQUEIRA (Sindicalista); VITOR RAMALHO (Jurista) -
que assina por si e em representação de todos os signatários)
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